Entrevista: Guilherme Fonseca, o guitarrista mais importante da carreira de Sandy & Junior
- Guilherme Moro
- 14 de out. de 2021
- 8 min de leitura
Guilherme Fonseca é mineiro de Belo Horizonte e hoje mora nos Estados Unidos. Guitarrista experiente, já dividiu o palco com grandes nomes da música de Minas e do Brasil como: Wilson Sideral, Sandy & Junior, Republica dos Anjos, Jota Quest, Bauxita, Júnia Lambert, Leo Maia, George Israel, Jair Oliveira, Milton Guedes entre outros. Em 2016 Guilherme Fonseca lançou seu primeiro álbum solo instrumental "Libertas".
Blog Música Boa
Para iniciar esse nosso bate-papo, gostaria de abordar o início da sua vida artística. Como a música entrou no seu cotidiano? Qual foi sua primeira guitarra?
Guilherme Fonseca
Olha, eu comecei desde muito. Eu respondi muito a estímulos de música. Meu pai ouvia muita trilha de cinema, é um cara de música brasileira. Sempre comento que tenho na memória esses discos de trilha sonora de filmes de época. Muitas vezes lembro delas, que estão na minha memória e trago isso às vezes para o meu trabalho. Minha primeira guitarra foi uma Tonante Rei, com três captadores, que depois eu troquei num video game. Tenho maior arrependimento (risos). Já tentei buscar essa guitarra e não consegui. Era uma guitarra bem simples mas, sinceramente, tem instrumentos que a gente aprende a gostar. Digo que sou um guitarrero, não um colecionador. Eu gosto de tocar. Tenho guitarra cara, mas coloco na estrada. Claro que tem algumas que a gente cuida mais do que outras. Sou mais um usuário do que um colecionador.
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A cena musical mineira é muito rica e com grandes referências. Como ela influenciou em seu trabalho e de que maneira você começou a se inserir no mercado?
Guilherme Fonseca
Eu já estava tocando com uma banda desde 88, chamada República dos Anjos, que eu tenho um carinho muito especial por ser um trabalho autoral. Eu desenvolvi um lado criativo muito grande. Com o República eu me expus como guitarrista de rock. O primeiro Rock In Rio, em 85, foi uma porrada. Aquilo me influenciou demais. Minas tem muita gente que toca bem por metro quadrado. Toda aquela química do Clube da Esquina influenciou muito na cena que se formaria dos anos seguintes. As gravadoras passaram a olhar para os artistas mineiros. Jota Quest, Skank, eu, que comecei a tocar com o Sideral e com muita gente ao mesmo tempo. Foi uma época de efervescência. Foi a grande virada de chave na minha vida. Foi fundamental.
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Durante muitos anos você foi membro fixo da banda que acompanhava a dupla Sandy & Junior. Como você os conheceu e de que maneira rolou esse convite?
Guilherme Fonseca
Tudo é um caminho e muita coisa acontece ao mesmo tempo. O músico tem alguns alunos para dar aula, algumas músicas que ele faz, um barzinho na quarta-feira, uma jam por aí. O músico é isso. Sandy & Junior é uma consequência dessa exposição que a gente fica nessa tara com música. Quando eu saí do Sideral, eu saí muito numa boa. Alguns meses depois, ele me liga pra fazer um show com ele, porque eu já conhecia o repertório. Era um show em São Paulo, com outros artistas e o Sideral ia ficar meio como mestre de cerimônias. Nesse show estavam o Falcão do Rappa, Bruno Gouveia do Biquini Cavadão, Lô Borges e um deles era o Junior. Paralelo a isso, eu havia conversado com o Henrique Portugal, do Skank, lá em Belo Horizonte. A situação era: eu tinha saído do Sideral e tava me reorganizando e fiquei muito duro nessa época. Quando a gente toca com um artista bacana, a gente faz muita coisa legal, mas acaba ficando longe da cidade e da cena local, então quando você sai de uma gig de média pra grande, que você some de fim de semana, na sua transição de volta você demora pra se reencontrar. Eu falei com o Henrique e disse que eu tava meio que disponível. Nessa ele me indicou pro Xororó e eu só fiquei sabendo disso depois. O resumo é que quando eu saí do Sideral rolou essa indicação, depois teve essa participação e nesse show estava o Junior dando uma canja. Nesse dia, eu e ele passamos o som e tocamos uma música do Jimi Hendrix. O Junior estava numa fase, que depois foi se consolidar com a Soul Funk, onde ele estava saindo mais e se colocando mais como artista por uma necessidade humana, musical e de direcionamento de carreira. Ele é um artista fenomenal, só da passo certo. Eu não ensinei nada pra ele, mas sem querer eu fui muito cortês em uma situação que o cara tava se expondo, no chão, num palco pequeno, ele que era um superstar. Acho que rolou esse clima nesse dia. Nossa amizade começou nesse tom. Acho que o que ele buscava era: “vamos fazer um som aqui. Nem lembra que eu sou o Junior, pelo amor de Deus” (risos). Depois de tudo, ele disse pra mim que tinha curtido a onda e pegou meu telefone. Foi uma baita coincidência. De duas vias eu cheguei no esquema: pelo Henrique e pelo Sideral.

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Na banda, você fez grandes amigos e tenho certeza de que até hoje mantém contato com a grande maioria. Como se deu essa amizade?
Guilherme Fonseca
Essa amizade deles é algo interessante. O músico mineiro quando consegue ir pra São Paulo, consegue tocar e ver a galera do mainstream. O Dudinha, o Erick, são meus amigos até hoje, porque foram pessoas que me acolheram, que eu sinto necessidade de me comunicar e estar em contato.
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A banda fixa de Sandy & Junior foi o embrião da Soul Funk, que tinha os mesmos integrantes e se apresentava todas as semanas no Na Mata Café em São Paulo. De que maneira surgiu esse projeto e como foi participar de tudo isso?
Guilherme Fonseca
A Soul Funk foi uma coisa totalmente despretensiosa. Eu fazia show com Sandy & Junior no fim de semana e na quarta-feira já estava todo mundo de novo no Na Mata Café. Era muito intenso. Ao mesmo tempo dessa correria, eu tava recém-casado, sem filhos e minha mulher descolou um pós-doutorado nos Estados Unidos. Pra carreira dela era ótimo e eu tava num pique danado com Sandy & Junior. Ela foi sozinha e eu fui lá por três vezes pra visitar ela. Cada um cuidando do seu sonho. Quando ela já estava de volta dos EUA, Sandy & Junior já tinham encerrado as atividades e rolou uma oportunidade de um trampo pra ela lá. Eu estava morando num flat em São Paulo por conta da Soul Funk. Toda essa época foi muito boa.

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Hoje você reside nos Estados Unidos e se adaptou a sonoridade do Texas. Nos conte como se deu essa migração e de que maneira ela agregou ao seu som
Guilherme Fonseca
Morar aqui foi muito natural. Depois que acabou Sandy & Junior, eu fiquei mais dois anos no Brasil. Eu rodei muito tempo. Foram dez anos na estrada. Quando ela teve a proposta de morar nos EUA, ela estava grávida e a gente resolver migrar para aqui. Eu estava muito cansado depois de tanto tempo de estrada e hotel. Queria ficar em casa, apesar de ser uma pessoa que ama sair pra tocar, passear e viajar sendo músico. Mudei-me para os Estados Unidos, pra Texas em específico. A cena aqui é de Country e Blues, do melhor do mundo. Eu aprendi a tocar Country muito bem e Blues por todas essas atmosferas que existem aqui. Eu dei uma imersão em coisas, que no Brasil soam ingênuas. A antena do mundo está aqui. Eu to aprendendo muito e pude me soltar como guitarrista de rock, mas tudo que eu carrego de música brasileira me ajuda demais. Esse cheiro de Minas, de Bossa Nova, a gente faz sem querer essa onda que agrade muito por aqui. É difícil de explicar. Tudo que é de música brasileira é muito bem vindo aqui.
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Hoje você é um dos representantes da marca Micheal, especializada em fabricação de instrumentos musicais. Essa oportunidade surgiu de onde?
Guilherme Fonseca
O meu vínculo é muito por causa do Rogério, que é dono da loja Serenata. Uma vez, passeando por Belo Horizonte, eu encontrei o Adriano, que é endorser da Michael e fui até a fábrica com ele. Conheci toda a turma e rolou. Foram três anos de contrato, que eu acho que até já venceu, mas eu continuo usando (risos). Só não vou ser da Michael se o Rogerião pegar e me tirar (risos). Vai ter que me expulsar, porque eu sou muito grato. A galera é muito massa. Se eles tiveram alguma crítica eu vou me redimir. Quero renovar e até pra turnê Nossa História eu tentei trazer, mas tinham muitas restrições por muitos contratos. É uma marca sensacional.
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2019 marcou o ano que a dupla Sandy & Junior retornou com uma turnê que marcou história, tendo você como guitarrista da banda fixa. De que maneira aconteceu o convite para participar deste marco?
Guilherme Fonseca
Cara, eu me convidei e fui convidado (risos). Quando a gente tem uma relação de amizade como eu e o Junior, eu perguntei a ele se ia rolar uma turnê. Porque meus parentes e amigos ficavam me perguntando. Quando ele me respondeu, ele disse que estava num baita sigilo, que havia uma negociação. Ele me perguntou que se rolasse eu gostaria de estar. Foi aí que meu mundo virou né, porque eu ajudo muito minha esposa aqui e sair por seis meses seria loucura. Eu mandei essa mensagem pra ele já me contando e meio que não podendo contar (risos). Ai amadureceu essa ideia e rolou. Foi massa demais e realimentou uma coisa do passado e que estava viva na memória. Essa turnê é um puta cartão de visitas.
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Quais foram os instrumentos e timbres utilizados por você na turnê Nossa História?
Guilherme Fonseca
Eu tenho o que eu preciso. Claro que se deixar por mim eu saio comprando. Pra turnê eu peguei um pedalboard e só uma stratocaster Jeff Back. Toquei na tour só com uma guitarra. Todo aquele repertório vasto que a dupla tem. Foi incrível. Nessas horas que o jacaré abraça cê tem que usar o que você usa em casa. As mais simples e confiáveis. A pedaleira que usei nessa tour foi a que eu uso todos os dias em casa. O importante é ter um instrumento que tenha familiaridade. Eu escolhi um Marshall JCM 2000. Eu amo equipamentos, mas nesse caso menos é mais.
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Nossa História foi a turnê mais rentável da história do Brasil e a segunda mais lucrativa de 2019, perdendo somente para a tour de Elton John. Ainda em fase de pré-produção, vocês esperavam que a turnê atingiria esse tamanho?
Guilherme Fonseca
A expectativa era que fosse algo menor. Ninguém esperava que fosse vender show em estádio. Quando eu saí de casa a gente já sabia que seria algo grande. Deu um frio na barriga violento. Foi divertido demais, mas com muito trabalho. Muita gente especializada, o Lucas, a equipe. A gente que ama aquilo ali, cada um com sua arte, foi lindo. Cada show era uma pancada, uma adrenalina absurda. É louco demais. Acaba muito rápido. Tinham momentos no palco que eu olhava aquele paredão de luz e de gente e achava louco. Às vezes tirava o fone pra ouvir o seu instrumento com o som batendo na arquibancada. Quando você para pra pensar no tamanho daquilo e daquela responsabilidade, você começa até a suar frio. Foi um ambiente familiar e com muita gente boa.
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Em 2016 você lançou o álbum "Libertas", seu primeiro e único trabalho solo. Como foram essas gravações e a elaboração desse projeto?
Guilherme Fonseca
Desde 2002 eu comecei a gravar em casa, com placa de áudio para registrar algumas ideias. Foi emendando umas ideias às outras e me deu muito orgulho e gravei o disco só eu e o baterista Samuca (Samuel Fraga). Fiquei muito orgulhoso. Quando eu estava gravando esse disco, foi durante a minha mudança para os EUA, então foi uma loucura. Fiz sozinho numa correria danada. Tive participações de muitos amigos nesse disco, como Adriano Campagnani, Duda Lima, Sérgio Carvalho, Paulinho Carvalho e Milton Guedes.