No Dia Mundial do Rock, o Blog Música Boa apresenta uma entrevista com Tico Santa Cruz, um dos grandes representantes do atual rock brasileiro. Ele é frontman do Detonautas desde a primeira formação e falou sobre os novos trabalhos da banda, momentos da carreira, pandemia e racismo
Blog Música Boa
Tico, gostaria de iniciar perguntando como tudo começou. De onde veio sua paixão pela música e o que te fez ter uma banda de rock?
Tico Santa Cruz
Sempre fui uma pessoa ligada à arte. Sempre gostei de música, desde muito criança. Me lembro de nas festinhas, ainda dos anos 80, que eu ouvia muito rock brasileiro, eu gostava de ficar imitando os caras. Os artistas do rock nacional dos anos 80 foram as minhas primeiras influências. Eles de certa forma me inspiraram a viver de música. Depois, mais velho, quando a MTV entrou no Brasil, comecei a conhecer as bandas internacionais e foi quando eu decidi que queria ser artista e vi que o meio para eu realizar esse desejo seria com o rock.
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O primeiro álbum da banda foi lançado em 2002, que foi um grande sucesso e continha alguns dos grandes hits da carreira do Detonautas. Vocês esperavam todo esse sucesso logo no primeiro álbum?
Tico Santa Cruz
O Detonautas nasceu em 97, então até a gravação do primeiro álbum foi uma ralação enorme. A gente trabalhou muito, fizemos várias demos, EP’s e singles, até chegar naquele álbum de estreia lançado pela Warner. Nossa meta sempre foi fazer um som pra muita gente. Era um objetivo muito forte. Claro que quando isso começou a acontecer a gente ficou muito feliz, porque sempre traçamos isso e alcançamos em 2002. Não poderia prever que isso iria acontecer, mas a gente sempre buscou chegar ao grande público.
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No ano passado, muito se repercutiu sobre as letras com cunho político dos singles o Detonautas lançou. Isso é uma característica da banda desde o início. Quais os prós e contras de todo o alvoroço criado em cima desses singles e clipes?
Tico Santa Cruz
Em agosto do ano passado a gente lançou o single “Carta ao Futuro”, que foi o primeiro single com uma abordagem relacionada à essa questão politica. Depois disso lançamos “Micheque”, por conta do episódio em que o Bolsonaro agrediu um repórter quando foi perguntado sobre os 89 mil depositados na conta da primeira dama. A gente percebeu que havia um hiato entre as bandas nacionais, não somente do rock, que não estavam falando de questões politicas, então a gente começou a imprimir uma abordagem relacionada à isso, mas esses temas não são nenhuma novidade na carreira do Detonautas.
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O álbum "Psicodeliamorsexo&distorção", lançado em 2006, é o mais experimental da carreira da banda? Como foi o processo de criação desse projeto?
Tico Santa Cruz
Sem dúvida nenhuma "Psicodeliamorsexo&distorção" foi o disco mais experimental da banda. O processo de criação foi todo feito dentro de uma casa abandonada. Montamos os nossos equipamentos e por meses fomos lá todos os dias, sem limite de tempo para compor e criar. Foi um processo bem diferente dos outros discos. A gente estava em um outro momento, com todo mundo vivenciando experiências particulares muito intensas. O disco é muito emblemático. Ele marcou uma fase triste também, porque logo depois perdemos o Rodrigo Netto (guitarrista do Detonautas vítima de latrocínio), ele foi produzido por Edu K, que é um cara muito a frente do nosso tempo. Sem dúvida o processo de criação foi muito bacana, os altos e baixos e tudo que ele representa na nossa carreira.
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"Racismo é Burrice" é o primeiro single lançado pelo Detonautas em 2021. Por que a escolha dessa faixa de Gabriel, o Pensador para abrir os trabalhos desse ano e qual a importância de falar de assuntos como esse em tempos sombrios como o de agora?
Tico Santa Cruz
A questão do racismo é um tema que faz parte da nossa discussão social há muitos anos. Por mais que a gente nunca tinha feito uma música desse assunto em específico, eu participei de vários seminários, atos, debates falando sobre o tema. O Gabriel é meu amigo de infância. Essa música é de 1993 e como ela já diz bastante sobre o tema, nós decidimos que não era necessário escrever uma nova música. A gente somente a pontuou para o racismo estrutural e mudamos dois versos. Acho que foi muito importante o Detonautas lançar luz neste assunto, porque não é uma luta só dos negros, mas principalmente dos brancos, que são responsáveis pela estrutura racista. O clipe da música é lindíssimo, com várias personalidades.
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Em entrevista ao nosso blog, o guitarrista Renato Rocha nos contou que a banda está com um sétimo álbum pronto. Qual a previsão para o lançamento e como foi o processo de pré-produção deste trabalho?
Tico Santa Cruz
Essas músicas com temas políticos que a gente lançou vão virar um álbum. A gente vai compilar tudo em um disco só, que será nosso sétimo disco. Também temos o oitavo disco pronto. Gravamos ele logo no início da pandemia. Ele será lançado ainda neste ano. São músicas mais existenciais, muito ligado com os sentimentos que todos nós passamos na pandemia. Ficou um disco muito bonito, que foi produzido pelo Marcelo Sussekind. Foi nossa primeira produção à distância. O processo foi todo feito por grupos de whatsapp. Foi diferente, mas nos mostrou que há outras possibilidades de se produzir
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O Detonautas teve o privilégio de se apresentar três vezes em um dos maiores festivais do mundo, o Rock In Rio. Na primeira oportunidade vocês fizeram um show no gigante Palco Mundo e na segunda e terceira participação, as apresentações se deram no cultuado Palco Sunset. Qual desses shows foi o mais marcante pra você?
Tico Santa Cruz
A gente alcançou o status de ser a primeira banda independente a tocar no palco mundo Rock In Rio. Isso já foi uma grande conquista. Eu sempre sonhei em tocar no festival. Era uma meta muito difícil de ser alcançada, mas a gente conquistou e foi incrível. Amamos o Rock In Rio desde a primeira edição e tocar lá sempre foi uma de nossas metas. Estive como espectador em 1991 e 2001 e em 2011 tive o prazer de estar no Palco Mundo. Em 2013 fizemos um tributo ao Raul Seixas, no Palco Sunset e em 2019 tocamos com o Pavilhão 9 fazendo uma participação no nosso show. O Rock In Rio é um dos maiores festivais do mundo. Todos os momentos foram contagiantes. É muito importante na nossa carreira.
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O Detonautas trilhou o seu caminho como independente durante quase uma década. Como foi retornar a Sony Music em 2019? Quais as maiores diferenças de ser um artista contratado de uma multinacional e ser independente?
Tico Santa Cruz
O Detonautas foi independente de 2011 até 2019. Pra uma banda de rock no Brasil, sobreviver independente é muito complicado. A gente que faz a estrutura, marketing, escritório, administração, logística, tudo isso fica em torno de nós, além de compor, criar os discos, gerenciar a carreira, então é muita coisa pra se fazer. Foi um período de aprendizado muito grande, mas sem dúvida nenhuma que desfrutar da estrutura de uma grande companhia é muito mais confortável e produtivo artisticamente.
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Voltando a falar da maratona de singles que vocês lançaram no ano passado, você acha que 2021 marca uma nova fase na banda, após tanto trabalho durante 2020?
Tico Santa Cruz
O Detonautas era um antes da chegada da pandemia e será outro após a pandemia. Acho que apesar de todos os problemas que a gente lamenta muito que aconteceu, toda a tristeza, principalmente no nosso meio que muita gente passou por dificuldades, se é que a gente pode pensar em algo bom de toda essa tragédia, é que produzimos muito e trabalhamos muito. Colocamos o Detonautas em outro lugar. Acho saímos da pandemia mais forte do que entramos, pela nossa resiliência, organização, dedicação e trabalho.
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Tico, gostaria que você falasse um pouco sobre os áureos tempos do "Rock Gol" da saudosa MTV. Você foi o artilheiro da edição de 2003. O famoso "Koala" ainda joga (ou jogava antes da pandemia) o seu futebol? (risos)
Tico Santa Cruz
Bons tempos da MTV, né? A gente encontrava os amigos, as bandas. Era uma época muito boa. A MTV foi muito importante na carreira do Detonautas. É uma história de altos e baixos, com alguns enfrentamentos e estresses, mas é muito mais coisa boa do que ruim. Acho que foi uma época muito divertida. Sinto falta de jogar o Rockgol, mas naquela época em tinha 22 anos, agora tenho 44. Ainda me mantenho ativo, fazendo esportes e tendo uma saúde que me proporciona jogar futebol depois da pandemia. Quem sabe em 2022 não role um torneio pra gente colocar a artilharia em prática.
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Para encerrar, além do novo álbum, quais os projetos previstos para 2021?
Tico Santa Cruz
Estamos focados em sobreviver da pandemia, todo mundo com saúde e bem. A ideia é ter grandes trabalhos em 2022 e voltar a fazer shows. Pra 2021 vamos lançar mais alguns singles e de um disco inteiro recortado em EP’s, pra que a gente possa manter nossas redes e nossa música em constante com os fãs.
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