DJ desde 2015, um apaixonado pela música desde sempre. Micheletti é DJ, educador e ainda é um dos responsáveis pelo Coletivo Tocaya. De 2014 a 2017, tive o privilégio de tê-lo como professor no ensino fundamental. Ainda nesse ano, teve sua música "Estrela Brilhante" incluída em uma coletânea da Itália. Confira a nossa entrevista!
Blog Música Boa
Micheletti, primeiramente é um prazer poder entrevistá-lo!
DJ Micheletti
O prazer é todo meu, Guilherme. Grande satisfação reencontrar você, que foi meu aluno, nessa situação bacana que é essa entrevista, apesar do cenário pandêmico que estamos vivendo. Agradeço o convite e o espaço para falar sobre meu trabalho. Bora lá!
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Gostaria de começar nosso bate-papo falando do recente convite que você recebeu para integrar uma coletânea italiana, que contém DJs do mundo inteiro, na qual você e outro DJ paulistano estão representando o Brasil. Como foi feito o convite da Salgari Records para você integrar a coletânea?
DJ Micheletti
Em 2018, eu já atuava como DJ e realizador de festas, mas passei a operar também em outra frente. Como já tinha alguma experiência com softwares de produção de áudio, comecei a editar músicas do cancioneiro brasileiro, a fim de criar minhas próprias versões dessas músicas, para tocar nas festas e também para compartilhar com outros DJs. Utilizo a plataforma Soundcloud para divulgar esses experimentos.
Acontece que aos poucos esses sons foram se espalhando entre a comunidade de DJs, sendo que alguns deles caíram no gosto não apenas de DJs do Brasil, mas também de algumas partes do mundo. Um deles foi o italiano Alberto Ciotta, que atende pelo codinome Al-Jive Mestizo. Foi ele quem me colocou em contato com o pessoal da Salgari Records e me convidou a participar da coletânea.
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Uma das grandes características de seu trabalho como DJ é a mistura de música brasileira com elementos da música eletrônica. Como você desenvolveu essa característica musical?
DJ Micheletti
Foi algo que aconteceu, por assim dizer, espontaneamente. Desde a adolescência, tenho paixão pela música e carrego aspirações musicais. A música brasileira está presente em meu trabalho como DJ porque, na verdade, é algo que faz parte de mim – faz parte da minha cultura e de minha história de vida. Já a música eletrônica é algo que veio depois, no início da idade adulta – quando descobri o lado mais alternativo e experimental desse tipo de som.
Quando comecei a fazer esses edits, eu não podia prever qual seria o resultado; o que eu tinha, isso sim, era a vontade de criar – ou, melhor dizendo, faço esses edits pois eles me permitem um contato mais íntimo com músicas de que gosto muito, e, se o edit fica bom, posso compartilhá-lo com mais DJs, que vão tocar esses sons para outras pessoas, e assim a coisa se espalha. DJs são, ou pelo menos deveriam ser, divulgadores de cultura e difusores de informação.
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Ainda falando da coletânea italiana da qual você faz parte, a canção produzida por você que integra o álbum leva o nome de “Estrela Brilhante”. Como foi o processo de criação dessa música e quais os samples que você utilizou?
DJ Micheletti
O convite para participar da coletânea chegou logo que os procedimentos de isolamento e quarentena começaram a ser adotados no Brasil. Então, dali em diante, eu teria mais tempo em casa do que o habitual – mas também havia um prazo para enviar a minha colaboração. Para me preparar, resolvi organizar um grande banco de loops e samples, recortando passagens e trechos das dezenas de músicas que eu já havia editado. Criei em minha área de trabalho uma pasta chamada “Loops do Brasil” e, durante algumas semanas, fiquei alimentando essa pasta.
Quando o prazo estava perto de se esgotar, comecei a tentar combinações entre esses loops. Num processo de tentativa e erro, cheguei ao resultado que recebeu o nome de “Estrela Brilhante”, em homenagem a um dos artistas sampleados na faixa: o grupo de maracatu Nação Estrela Brilhante, sediado em Recife. Eu queria chegar num som que fosse bem brasileiro, mas que ao mesmo tempo não fosse totalmente familiar, que tivesse certa novidade ou estranheza. Combinei loops de maracatu, ciranda e coco – sampleando canções de Zezé Motta, Dona Glorinha do Coco e Lia de Itamaracá. E a essa mistura acrescentei elementos eletrônicos. Sintetizador para dar atmosfera e bateria eletrônica para sons subgraves.
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Você é DJ desde 2015, mas percebe-se que a música é algo presente na sua vida desde muito novo. Como a música entrou na sua vida e quais suas maiores influências musicais?
DJ Micheletti
A música está comigo desde sempre, mas principalmente a partir da adolescência. Dos 12 aos 14 anos, fiz aulas de guitarra. No final das contas, não levo muito jeito para tocar um instrumento, sou desajeitado. Mas nunca perdi o contato com a música. Ser DJ é uma maneira de estar em contato com a música, e fazer música – mesmo eu não sendo músico, em um sentido mais estrito ou tradicional.
Sobre as influências, eu poderia responder de diversas formas. Mas vou aproveitar o espaço para citar alguns DJs e produtores do Brasil que faço questão de acompanhar, e que estão sempre em minhas seleções: Lucio K, Gaspar Muniz, Tahira, Maga Bo, Chico Correa, DJ Flavya.
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Você tem um acervo de discos de vinil extremamente interessante. Como surgiu esse gosto pelos LPs e quais os discos favoritos da sua coleção?
DJ Micheletti
Nasci na metade dos anos 80, vivi esse momento de transição do analógico para digital. Gosto muito de LPs. Porém seu mercado se acha inflacionado, ficou muito caro adquirir LPs. Sem falar no transtorno que eles são para guardar e transportar. Para dizer a verdade, eu praticamente não tenho comprado discos de vinil nos últimos anos. Pode parecer estranho, mas tenho investido mais em CDs, que é algo que tem a ver com minha rotina de editar som com ferramentas digitais.
Meu acervo é variado e eclético. Diversos estilos e gêneros. Não consigo listar discos favoritos. Vou destacar apenas o álbum de 1973 do grupo Os Tincoãs, que é uma das relíquias em minhas prateleiras.
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Seu trabalho como educador está presente em sua vida há mais tempo que seu trabalho como DJ. Hoje, qual dos dois trabalhos te dá mais prazer, tanto na vida profissional quanto na pessoal? De que maneira você envolve a música em suas aulas?
DJ Micheletti
As duas coisas se complementam. São dois lados que eu tenho, independentemente de qual dá mais prazer, os dois são igualmente importantes e necessários para mim.
Você foi meu aluno. Deve se lembrar, talvez, de uma ou outra atividade envolvendo música. Fico empolgado quando, em sala de aula, rola alguma atividade envolvendo música e tento transmitir essa empolgação aos alunos, por assim dizer, sem forçar a barra. A música tem um lado lúdico, que facilita a aprendizagem. Mas não vamos esquecer que estou ali como professor, e não como DJ. E há um plano de aula a ser seguido. Então, nem sempre acontecem essas situações extraordinárias de aprendizado. Lembro que, pouco antes da suspensão de aulas em decorrência da pandemia, escutei com os alunos de sétimo ano uma música da Karol Conka porque a letra estava no livro didático deles.
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Você faz parte do Submundo, grupo de música eletrônica alternativa, que tem uma vasta discografia com 10 álbuns lançados no Spotify e 13 álbuns na plataforma Bandcamp. A banda não faz apresentações e só realiza encontros esporádicos uma ou duas vezes ao ano para a gravação de um álbum. Como surgiu a ideia da criação desse projeto e quais são as pessoas que estão por trás do mesmo, além de você?
DJ Micheletti
Começou em 2014. Um grupo de amigos que se reunia para fazer churrasco e som eletrônico ao mesmo tempo, gravando o áudio dessas sessões em interface multipista. Com o passar do tempo, a galera foi aderindo à alimentação vegetariana, e o churrasco foi trocado pela pizza. Os encontros se tornaram mais esporádicos, mas continuam acontecendo. No geral, cada sessão reúne de 4 a 8 pessoas.
Ao longo desses tantos álbuns, a qualidade do som foi melhorando também. Aquela história: algo que começou como uma brincadeira e acabou ficando legal, deu certo. Só que é um projeto totalmente desconhecido; você só conhece porque é meu amigo e foi meu aluno (risos). E o som é bem incomum, atípico. Recomendo para quem quer ouvir coisas novas e diferentes. Às vezes, o som sai da curva e fica meio estranho – mas vale a pena passar um tempo nesse submundo, garanto que há pérolas a serem descobertas ali.
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Ainda falando sobre o Submundo, como é feito o processo de gravação e concepção das faixas?
DJ Micheletti
Quando nos encontramos, não há nada previamente combinado. São sessões de improviso, bem espontâneas, que se estendem por algumas horas e são gravadas. É um pouco caótico, mas posteriormente esse material é editado e lapidado, e o resultado são esses álbuns que estão no Bandcamp do Submundo. Para cada encontro, nasce um álbum.
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O Coletivo Tocaya foi idealizado em 2017 e hoje é seu principal projeto. Consiste em realizar eventos relacionados à música tendo como principal objetivo a dança, a interação de pessoas e a diversão, tudo isso com DJs tocando ao vivo, em espaços abertos. Como surgiu a ideia para a execução desse projeto?
DJ Micheletti
Note que você utilizou o termo “coletivo”, isso significa que não é uma empreitada apenas minha. O projeto foi idealizado por Nat Rozendo e por mim, de modo que nós dois respondemos igualmente pelo Coletivo, como idealizadores e gestores.
Nós dois estávamos atuando há algum tempo no setor de eventos, trabalhando em feiras de economia criativa, e acabamos unindo forças para atuar e empreender no segmento cultural, realizando eventos que eram como festas de rua, pois aconteciam em locais públicos, com DJs tocando música brasileira e pista de dança a céu aberto. Assim nasceu a Tocaya, que neste mês (junho de 2020) está completando 3 anos de vida e atuação.
Até criamos um website: www.coletivotocaya.com.br, que convido os leitores a visitar, o site está novinho, acaba de ser lançado. Será um de nossos canais de comunicação e registro de atividades.
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Nesse período difícil que estamos atravessando, a Tocaya realizou lives intituladas “Entoca”. Como tem sido a dinâmica dessas lives? Como transmitir à distância essa energia de pessoas interagindo e dançando juntas?
DJ Micheletti
Começamos com eventos em locais públicos. Sem deixar de fazer isso, posteriormente passamos a fazer eventos em locais fechados. E mais recentemente, devido à pandemia, migramos para um formato digital, sintoma dos tempos singulares que estamos vivendo: os eventos virtuais.
Criamos um canal de YouTube chamado TocayaTV para fazer transmissões ao vivo. E um programa para veicular esses eventos virtuais, chamado ENTOCA, que é um trocadilho com Tocaya, e também uma palavra de ordem: em tempos de pandemia, fiquemos em casa. A Tocaya vai te ajudar a fazer isso, a ficar na toca, levando música e entretenimento de qualidade até você. Esse é o conceito.
Montamos em meu estúdio uma espécie de cabine de DJ e dela transmitimos mundo afora o som que rola nas festas da Tocaya. Fazemos nosso melhor para levar uma energia que seja boa para o público que acompanha nossas transmissões e interage com a gente através do chat e do Instagram. Outra coisa legal é a participação, ao vivo, de outros DJs. Em abril, o DJ Gaspar Muniz participou de nossa transmissão direto de seu estúdio em Nova Iorque. Também tivemos a participação de Wisley Luiz nos toca-discos, que mora a poucas quadras daqui e participou de nosso programa ao vivo, só que da casa dele.
Em junho, teremos duas grandes atrações nas lives que faremos para celebrar 3 anos de Tocaya: Tahira e Amaral Ed, dois DJs que admiramos muito. Quem frequenta nossas festas já conhece o som do Tahira, porque sempre tocamos os edits dele, que são sucesso nas pistas do Brasil e do mundo.
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Ainda falando da Tocaya, o projeto ganhou uma versão em Podcast que está disponível no Spotify, Soundcloud e Mixcloud. Como surgiu a ideia de criar um Podcast com algumas faixas tocadas nos eventos realizados pelo Coletivo Tocaya?
DJ Micheletti
Tem muito a ver com o tempo que estamos vivendo e a necessidade de buscar alternativas de comunicação e contato com as pessoas que vão às festas da Tocaya, num cenário em que eventos presenciais não são permitidos.
As pessoas nos pediam isso e agora também estamos no Spotify, que é uma das plataformas mais utilizadas para ouvir música hoje em dia. Se der tudo certo, pretendemos fazer postagens regulares nesse canal de podcast. Aliás, isso tem a ver com nosso desejo de tocar uma web-rádio. Pode ser que, de certa forma, já estejamos nos preparando para isso.
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Para encerrar a entrevista. Gostaria que você falasse cinco discos que moldaram sua identidade musical e que fazem sua cabeça até hoje.
DJ Micheletti
Olha, de todas as perguntas essa foi a mais difícil. Vou mencionar cinco álbuns que são muito importantes para mim. Começando com dois clássicos da música brasileira. Depois dois álbuns gringos, um dos anos 70, outro dos anos 90. E por último um medalhão do jazz, de 1959!
Os Tincoãs - Os Tincoãs (1973)
Jorge Ben - A Tábua Esmeralda (1974)
Brian Eno - Another Green World (1975)
Air - Moon Safari (1997)
The Dave Brubeck Quartet - Time Out (1959)
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Micheletti, foi uma honra entrevistar você. Espero que tenha gostado e que possamos nos encontrar muito em breve. Grande abraço!
DJ Micheletti
Mandou bem, parabéns pela iniciativa, Gui. Gostei muito, e estou de acordo: que possamos nos encontrar em breve. Aquele abraço!
Foto: Nat Rozendo
Foto: Lívia Maria Terra
Foto: Lívia Maria Terra
Foto: Lívia Maria Terra
Imagem de divulgação: Salgari Records
(Roze e Micheletti) Foto: Lívia Maria Terra
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