Música Boa: Os Melhores Álbuns Nacionais de 2025
- Guilherme Moro
- há 3 horas
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O ano foi generoso com a música brasileira. Tão generoso que, desta vez, não conseguimos fechar a lista em dez. Pela primeira vez, desde que o Música Boa, por meio de sua curadoria, elenca os melhores álbuns de cada ano, escolhemos 15 discos que se impuseram pela qualidade, pela coragem e pela capacidade de dialogar com um público cada vez mais diverso. Não foi uma escolha fácil. Mas o legal. é que talvez por isso esta lista exista. Ela não aponta apenas os “melhores”, mas aqueles que, de alguma forma, moveram algo dentro de nós e dentro da cena.
Para chegar aqui, seguimos critérios que sempre guiam o Música Boa: originalidade, identidade bem definida, relevância estética, força narrativa e, principalmente, capacidade de comunicação, até porque música é encontro, e ninguém faz arte para ser confinada entre quatro paredes.
Consideramos também a coerência entre conceito e execução, a evolução de cada artista dentro de sua própria trajetória, o risco criativo, o impacto cultural e, claro, a longevidade da obra. O resultado é um panorama afetivo e crítico do que ouvimos de mais potente nos últimos 12 meses. Discos para pensar, para sentir, para dançar, para respirar e, acima de tudo, para ouvir de verdade. Boa leitura!

15 - "No Escuro, Quem é Você?" | Carol Biazin
Temos ouvido diferentes versões e dilemas de Carol Biazin desde o destaque que ganhou como compositora de diversas faixas do álbum "Doce 22" de Luisa Sonza. Em sua estreia, com "Beijo de Judas", a artista trouxe melancolia e muitos questionamentos em relação ao mundo. Em "Reversa", errou a mão e deixou com que suas faixas fossem sucumbidas por temas rasos e batidas sem identidade. "No Escuro, Quem é Você?" é uma grata surpresa e demonstra uma ascendente e uma evolução de seu primeiro álbum.
Os questionamentos ainda continuam lá, mas agora com um mergulho no pop dançante sem forçação de barra e com mais corpo instrumental, impulsionado por metais e excelentes ambientações, que chegam a flertar com o indie rock em alguns momentos. Se em "Reversa" ela preferiu ser literal com faixas como "Playlist de Sexo", neste álbum Carol deixa o papo mais subentendido. É o caso da excelente balada "Códigos". Ela ainda foi premiada com a versão de Felipe Amorim, que popularizou a música nas redes sociais.
O acerto de rota da carreira de Carol justifica a entrada do disco como um dos melhores produzidos no Brasil em 2025.

14 - "Natural" | Terraplana
Depois de fincar o nome na cena independente com "Olhar pra Trás (2023)", um debut denso, sujo, quase catártico, que rendeu ao Terraplana o primeiro lugar na lista do Música Boa daquele ano, a banda retorna em "Natural" com um trabalho que afirma a identidade construída na estreia e revela pistas de onde eles podem chegar.
É verdade que o novo álbum não se arrisca tanto quanto o anterior. Aquele choque inicial, aquela sensação de queda livre que o disco de estreia proporcionava, aqui aparece mais domada. Não é um defeito e quando pensamos em construção de uma estética, pode ser considerado um acerto. Por isso, dentro dessa escolha, o Terraplana continua brilhante.
Os melhores momentos do disco estão justamente quando a banda permite que a luz entre pelas frestas: "Amanhecer" e "Charlie" se destacam com arranjos mais limpos, vocais etéreos e uma construção melódica que expande a paleta emocional do grupo. São faixas em que o Terraplana mostra como sabe ser intenso sem necessariamente ser ruidoso.
A melancolia, marca registrada desde o início, permanece intacta. Ela está ali, sustentada pelos pratos com aquele ataque infinito em um mar de reverberação, mas agora diluída em composições mais abertas, um pouco mais melodiosas. É como se a banda tivesse começado a retirar algumas camadas de ferrugem para revelar matizes que estavam escondidos.
É bonito ver o Terraplana mantendo o que funciona, mas também apontando para novas direções, mesmo que ainda timidamente. A sensação final é de que o melhor deles pode estar por vir. Ficamos, claro, de ouvidos atentos para o próximo capítulo.

13 - "O Mundo dá Voltas" | BaianaSystem
BaianaSystem nunca foi grupo de permanecer no mesmo lugar. Ainda que "O Mundo Dá Voltas" recupere muitos elementos já explorados em trabalhos anteriores, o álbum surge com um frescor particular: a entrada de novos colaboradores redesenha o mapa sonoro sem quebrar a espinha dorsal que tornou o coletivo soteropolitano um dos mais relevantes do país.
O discurso político, firme e inegociável, continua lá: direto, urgente, ritmado pelo diálogo entre guitarra baiana, beats eletrônicos, percussão e aquela atmosfera de rua que só o Baiana sabe criar. Mas é nos encontros que o disco realmente se ilumina. Anitta, Gilberto Gil, Melly, Emicida, nomes de universos distintos, trânsitos diferentes, estéticas quase incompatíveis entre si, aparecem aqui como se sempre tivessem pertencido ao carnaval de rua liderado por Russo Passapusso.
As participações se encaixam com naturalidade nas notas agudas da guitarra baiana, que continua sendo a verdadeira narradora dessa história. Anitta traz um tempero pop sem diluir a força do discurso; Gilberto Gil empresta sabedoria, calma e ancestralidade; Melly adiciona poesia fresca e voz aveludada; e Emicida, como sempre, chega com densidade e precisão cirúrgica. São feats que não soam acessórios ou marqueteiros. São peças estruturais do álbum.
O "Mundo Dá Voltas" é plural no melhor sentido. Tem momentos de dança, de contemplação, de raiva, de alegria, de reflexão, de luta. É um disco para celebrar e para protestar, para se perder e se reencontrar uma obra que segue a tradição do BaianaSystem de transformar música em movimento coletivo.

12 - "Nenhuma Estrela" | Terno Rei
Costumo brincar que o Terno Rei é um dos grupos mais mineiros de São Paulo. Não falo isso apenas pela longeva sintonia com Samuel Rosa, que subiu ao palco com eles no Popload no Parque do Ibirapuera, em um dos shows mais elegantes do ano. Nem pela parceria sublime com o já saudoso Lô Borges em "Relógio", uma das faixas mais delicadas e emocionantes deste novo trabalho.
A mineiridade que vejo está naquela calmaria calculada, no gosto pelo detalhe, na palavra escolhida com cuidado, no silêncio que também fala. Tudo isso sem nunca abandonar o sotaque paulistano que molda o Terno Rei desde o início. E tem mais de BH com a delicadeza do feat "Tempo", com Clara Borges.
"Nenhuma Estrela" continua explorando a mistura que eles dominam: indie melancólico, melodias limpas, harmonias que soam como ecos do Clube da Esquina, tudo conduzido com a precisão habitual de Ale Sater, Bruno Paschoal e Greg Maya. É um álbum que reafirma o que o Terno Rei sabe fazer e faz muito bem. Não apresenta uma ruptura, não busca reinvenção radical, não tenta ser revolucionário. Mas talvez essa seja justamente a sua força. Ele até entrega um chiclete: "Próxima Estação" tem um refrão que não sai da cabeça.
Com extremo bom gosto, o disco crava ainda mais a identidade do grupo, mostrando uma banda madura, confortável dentro da própria estética, mas nunca preguiçosa. A faixa-título é um dos grandes momentos, resumindo a atmosfera suave e introspectiva que permeia toda a obra.
Nenhuma Estrela prova que nem todo passo precisa ser ousado para ser significativo. Às vezes, manter o caminho, polindo cada aresta e aprimorando o que já é legal, pode valer tanto quanto apontar para algo completamente novo. O Terno Rei sabe muito bem disso.

11 - "KM2" | Ebony
Em KM2, Ebony toma seus próprios fantasmas pela mão e os transforma em arte. Traumas, releituras e memórias do passado guiam o percurso emocional do álbum, mas nada aqui soa como lamento: tudo vira rima, fluxo, ataque e, sobretudo, verdade. A artista mergulha na própria história sem pedir licença, expondo feridas e fragilidades, mas mantendo o pulso firme que sempre definiu seu estilo.
O nome do disco já diz muito. KM2 é uma homenagem direta à sua cidade natal, Queimados, na Baixada Fluminense, ou “K-M-Dois”, como Ebony e amigos costumavam chamá-la. É mais que geografia: é origem, código afetivo, ponto de partida de quem aprendeu cedo que sobrevivência também é forma de expressão. É o caso do que narra na letra de "Não Lembro Da Minha Infância".
A força de Ebony está em como ela costura todos esses elementos, equilibrando provocações afiadas com momentos de intensa vulnerabilidade. Quando se abre, se abre de verdade; quando ataca, ataca com precisão, até mesmo se gabando. É o caso da primeira faixa. O impacto vem tanto das rimas quanto das pausas, das imagens que projeta e das verdades que insinua.
"Festas e Manequins" ganhou o mundo na trilha sonora do jogo FC 26. Mas o mérito não é esse. E sim um disco que carrega peso, coragem e poesia, e que mostra que revisitar a própria história pode ser, também, um caminho de reinvenção.

10 - "Baile à La Baiana" | Seu Jorge
Dez anos separam Seu Jorge de seu último álbum de inéditas. Uma espera longa, mas que valeu a pena. "Baile à La Baiana" marca o retorno triunfal de um artista que sempre soube transitar entre o charme de um dos graves mais incríveis do país e a devoção à música negra brasileira.
O disco devolve Seu Jorge às pistas, aos bailes black do Rio de Janeiro, às esquinas quentes da Zona Norte e aos clubes onde a negritude sempre foi som, corpo e resistência. É como se ele tivesse voltado ao fim dos anos 1990 com a impecável sonoridade da Farofa Carioca, só que filtrada pela maturidade de quem viveu, aprendeu e agora devolve ao público uma celebração afetuosa e cheia de energia.
Seu Jorge eleva e exalta a música negra com respeito e irreverência. "Gente Boa Se Atrai" desponta como a faixa mais envolvente: groove certeiro, balanço imediato, a síntese perfeita do espírito do disco. Mas "Baile à La Baiana" é daqueles álbuns que se escutam de corpo inteiro. Tem brilho, tem suor, tem romance, tem charme, tem brasilidade sem caricatura.
É música feita para ser vivida: para tocar alto num sábado à noite, cerveja gelada na mão, para te acordar no meio da semana quando o marasmo bate, para transformar a volta de ônibus das 18h em um mini baile particular. É um disco que devolve alegria, autoestima e movimento para quem ouve. Um dos melhores trabalhos de Seu Jorge na carreira e certamente um dos grandes discos do ano.

9 - "Veras l" | Vera Fisher Era Clubber
Sem dúvidas, este é o disco mais ousado e provavelmente o mais inesperado de toda a lista. "Veras I" soa como um portal temporal aberto diretamente para uma boate bate-estaca do Rio de Janeiro nos anos 1990, algo entre o Hell’s Club e um after interminável com burgueses em Copacabana.
A estreia da banda Vera Fisher Era Clubber é um mergulho no caos organizado: letras nonsense, humor ácido, poesia torta e influências que vão de Fernanda Abreu a Jupiter Maçã, passando por referências eletrônicas que parecem tiradas de um sonho distorcido de uma propaganda da MTV.
É impossível não se divertir ou tirar uma risada do canto da boca ao ouvir faixas como "LOLOLOVE U" e "Altinha". A música homônima ao grupo é uma compilação de celebridades nacionais e internacionais. Da própria Vera Fisher a Lindsay Lohan. Não tente decifrar.
O disco não oferece descanso e nem pretende. Cada faixa é uma nova onda batendo no peito, uma pancada atrás da outra, como se a banda estivesse em missão de impedir qualquer traço de monotonia. E o mais curioso é que, ao final, ficamos sem a menor ideia de para onde eles vão nos próximos capítulos: Veras 2, Veras 3, seja lá o que vier. Não dá para prever nada, e essa talvez seja a maior qualidade do grupo.

8 - "Maravilhosamente Bem" | Julia Mestre
Uma das vozes mais interessantes e inventivas de sua geração, Julia Mestre segue em trajetória ascendente. Aqui, ela não está apenas bem. Ela está Maravilhosamente Bem. Em seu terceiro álbum de estúdio, a artista assume de vez uma sonoridade funk temperada por influências oitentistas, construindo um universo pop sofisticado, sensual, cheio de texturas e melodias que grudam sem perder profundidade.
É impossível não reconhecer ecos de Marina Lima, especialmente daquela fase mais pop e brilhante de "Fullgás", ou do período mais criativo de Rita Lee e Roberto de Carvalho. Mas o grande mérito de Julia é justamente esse: ela convoca referências gigantes sem soar derivativa. Nada é cópia. Tudo é homenagem filtrada por sua personalidade.
“Marina Limou”, parceria com a própria Marina Lima, talvez seja o exemplo máximo dessa troca geracional: um encontro simbólico e musical que funciona como manifesto. A estética que já dava sinais promissores no antecessor "Arrepiada" aqui explode de vez: linhas de baixo irresistíveis, guitarras brilhantes, chorus oitentista no ponto exato, vocais limpos e marcados, tudo costurado com uma elegância pop que Julia domina com naturalidade rara.
E a qualidade do trabalho não passou despercebida. A indicação ao Grammy impulsionou sua carreira para além da bolha da cena alternativa, colocando uma turnê na rua, ampliando o alcance, abrindo portas. É aquele tipo de álbum que confirma talento, mas também anuncia futuro. Se este disco é um passo, ele é enorme. E, para Julia Mestre, é só o começo.

7 - "Big Buraco" | Jadsa
Dormir bem, viver bem, comer bem, falar legal. Parece pouco, mas segundo Jadsa, é exatamente isso o que nos move: as coisas mais simples. É este o tema da faixa "Big Bang", que abre “Big Buraco”. Mais uma das artistas incríveis que nasceram em Salvador, elachega ao segundo registro de sua carreira fonográfica, sem contar os singles e os quatro EPs lançados ao longo da última década.
O novo álbum chega como um registro urgente e prático. Assim foi, da produção ao lançamento. Uma fase que ela quer que seja rápida, mas nós queremos aproveitar cada segundo.
Além de "Big Bang", destacam-se “No Pain” e sua levada arrastada, leve e viajante, “Sol na Pele”, talvez a mais comercial do projeto, com refrão pra cantar junto e tudo que um bom hit pede, e “Big Mama”, um jogo de palavras que à princípio causa estranheza, mas conquista em poucas audições.
Esta, sem dúvidas, é a guinada mais popular da artista, que mostra interesse em aumentar o seu público sem se desprender de suas principais características. É um grande registro!

6 - Afim | Zé Ibarra
Assim como sua companheira de Bala Desejo, Julia Mestre, Zé Ibarra parece colocar um tijolo a mais na própria carreira a cada novo lançamento. "Afim" chega justamente nesse ponto de maturidade: um disco que olha para o passado com carinho, para o presente com atenção e para o futuro com curiosidade. É seu segundo trabalho e o mais diverso e surpreendente até agora.
Aqui, Zé abraça de vez uma estética que mistura décadas com timbres que remetem aos anos 1970 e 1980, arranjos sofisticados, melodias limpas mas sem abrir mão de letras e escolhas artísticas absolutamente contemporâneas. O álbum respira leveza e invenção, ao mesmo tempo que carrega aquela elegância melódica que já virou marca registrada do artista. O registro agudo do artista é o charme principal.
Zé mergulha em composições de nomes que dialogam diretamente com seu universo: Sophia Chablau aparece com duas faixas, "Hexagrama 28" e "Segredo", esta última originalmente um rock acelerado que ele transforma em um pop elegante. De Tom Veloso, ex-parceiro de Bala Desejo, ele traz "Morena".
O que impressiona em "Afim" é a coesão: apesar de tantas referências e colaborações, o disco soa absolutamente dele. Há identidade, há intenção, há cuidado. Tudo é bem colocado, bem arranjado, bem cantado. Zé Ibarra confirma, mais uma vez, que é um dos artistas mais sensíveis, talentosos e inventivos de sua geração.

5 - "Novo Mundo" | Arnaldo Antunes
“Cada vez mais plástico e menos água. Cada vez mais casca e menos substância”. É com esse verso que Arnaldo Antunes abre seu "Novo Mundo", e talvez não exista forma mais precisa de apresentar o disco ao ouvinte. Um dos maiores poetas que este país já produziu, o ex-Titã retorna com um trabalho que equilibra crítica social, experimentação sonora e uma lucidez rara sobre o tempo em que vivemos.
Arnaldo se reinventa falando de temas absolutamente atuais: inteligência artificial, superficialidade digital, o bombardeio de apostas esportivas que inundam o futebol e a vida cotidiana.
As colaborações são um capítulo à parte. A parceria com David Byrne em “Body Corpo” é elétrica, pulsante, um encontro de mentes inquietas. “O Amor é a Droga Mais Forte” surpreende ao incluir um autotune improvável e funcional que mostra o caráter inventivo do álbum. Mas o grande triunfo é “Pra Não Falar Mal”, parceria luminosa com Ana Frango Elétrico, que desmonta a lógica do ódio e propõe outra maneira de existir, mais aberta, mais sensível. Em “É Primeiro de Janeiro”, Arnaldo oferece um sopro de esperança: uma canção que abraça e promete dias melhores, quase um rito de passagem para o ano que se anuncia.
"Novo Mundo" é melancolia e pressão, mas também otimismo e poesia. Um disco que olha de frente para o caos, mas sem perder de vista a possibilidade de transformação. Coisas que só gênios como Arnaldo Antunes conseguem provocar na gente.

4 - "Diamantes, Lágrimas e Rostos para Esquecer" | BK
Neste álbum, BK realizou um dos sonhos máximos de qualquer rapper: samplear tudo o que quer, tudo o que ama com total liberdade criativa. E que sorte a nossa que ele pôde fazer isso. O resultado é um disco de altíssimo refinamento, que não só revisita a música brasileira com afeto e inteligência, como eleva cada referência a um novo patamar.
O gesto mais emblemático talvez seja o resgate de Evinha, uma das artistas mais injustiçadas da nossa história musical. BK sampleia “Esperar Pra Ver” e transforma a faixa em trend, devolvendo sua força para uma nova geração. Reparação, homenagem e reinvenção ao mesmo tempo.
Os mergulhos continuam: Fat Family, Djavan, Luciana Mello, todos revisitados com sensibilidade e, principalmente, bom gosto. BK trata cada sample como peça de ouro lapidada, encaixada com precisão cirúrgica na construção de um disco que é tanto memória quanto futuro.
Nas letras, ele se expõe mais do que nunca. Há confissões, fragilidades, melancolia e, ao mesmo tempo, firmeza. É um BK que se permite sentir sem perder a contundência. O rapper também pisca para o pop em diversos momentos, expandindo paleta, público e ambições, sem diluir identidade. Um golaço!

3º - Alberto Continentino | "Cabeça a Mil e o Corpo Lento"
Pegue toda a criatividade artística de um dos maiores baixistas surgidos no Brasil nos últimos dez anos. Misture isso com letras de gente absolutamente singular como Ana Frango Elétrico, Negro Leo, Domênico Lancellotti, Silvia Machete. O resultado não poderia ser outro: um dos discos mais elegantes e inventivos do ano. Um álbum de identidade clara, sensibilidade rara e produção que transborda esmero.
Albeto Continentino, que já tocou com praticamente todo mundo, de Caetano Veloso a nomes fundamentais da cena contemporânea, finalmente coloca holofote sobre si. E o que ele entrega em "Cabeça a Mil e o Corpo Lento" é um documento artístico que abraça passado, presente e futuro da música brasileira sem nenhum pudor.
As referências chegam fortes: rock setentista, timbres quentes de sintetizadores, arranjos que parecem viajar mas nunca perdem a mão da melodia. Tudo é construído com precisão, mas soa orgânico, leve, quase como se estivéssemos acompanhando o fluxo de pensamento de um músico que pensa a música com o corpo inteiro.
É um álbum de coragem estética e de generosidade criativa, que coloca Continentino no centro da nova música brasileira como algo maior do que um instrumentista brilhante: um artista completo.

2º - "Um Mar Pra Cada Um" | Luedji Luna
No mais recente capítulo de sua trajetória, Luedji Luna evidencia, mais uma vez, a capacidade rara de transformar vulnerabilidades em matéria estética. "Um Mar Pra Cada Um" soa como um mergulho prolongado: não é fácil de assimilar. A artista constrói aqui um território de calmaria tensa, que convida o ouvinte a desacelerar e a perceber detalhes que só surgem quando se aprende a respirar no ritmo do disco.
O álbum funciona como um ponto de chegada de um processo que Luedji vem desenvolvendo ao longo dos últimos anos. Os arranjos, por vezes, caminham em direções próprias, criando diálogos e silêncios que ampliam a sensação de contemplação.
As parcerias mostram essa intenção. Os encontros com músicos de diferentes origens, cada um imprimindo sua própria temporalidade, dão ao disco um caráter quase ritualístico. São colaborações que não existem para “embelezar” a música, mas para tensionar o que já estava ali, abrindo frestas para novas leituras. Destaques para "Rota" com Lucs Romero e "Harém", com Liniler.
Se há uma mudança perceptível em relação aos trabalhos anteriores, ela está nas escolhas temáticas. A contundência política, que antes atravessava sua obra com mais força, agora dá espaço a um conjunto de canções que orbitam sentimentos íntimos, circunstâncias afetivas e zonas de incerteza.
Luedji entrega uma obra que não precisa se impor para ser marcante: ela se estabelece pela consistência, pela maturidade artística e por uma expressividade que continua a colocá-la entre as vozes indispensáveis da música brasileira contemporânea.

1º - "Dominguinho" | João Gomes, Jota.pê e Mestrinho
Há coisas que não pedem discussão, apenas aceitação. E não há como negar: "Dominguinho" é o grande álbum do ano. A combinação das vozes de Jota.Pê, Mestrinho e João Gomes produz um encaixe raro, daqueles que parecem ter sido escritos antes mesmo de qualquer um nascer. É o tipo de encontro que, quando acontece, reordena o calendário da música brasileira.
Mas a força do disco está além dessa química vocal. O trio atinge um ponto de equilíbrio improvável: ser profundamente popular e, ao mesmo tempo, sofisticado em cada detalhe. O cenário, a presença, o carisma dos três. Tudo opera a favor de uma obra que transita com fluidez entre a sensibilidade nordestina e a elaboração musical.
Assim como no ano passado só se falava do impacto de "Caju" e Liniker, 2025 encontrou seu consenso em torno desse trabalho. Nada mais natural que a coroação no Grammy Latino. Era o tipo de vitória que já se desenhava desde o lançamento. "Lembrei de Nós" virou um hit absoluto, desses que ultrapassam o nicho e alcançam quem só passa pelo streaming de raspão. "Flor" e "Beija Flor" seguem pelo mesmo caminho. E a verdade é que qualquer faixa poderia ser destacada. O álbum é inteiro sólido, direto, bonito sem precisar inventar.
A simplicidade da sonoridade, que aposta no essencial, é justamente o que torna o projeto tão grandioso. Não há excesso, não há maquiagem: há música bem feita, executada com afeto e inteligência. É comum que listas de melhores do ano tragam ressalvas, contextualizações, pontos de equilíbrio. E se você quiser, pode contestar tudo o que foi dito nas demais posições. Mas em relação ao líder, meu amigo, não há discussão.





