Em 2017, sete anos depois da sua mixtape de estreia, Flora Matos lançou "Eletrocardiograma", seu primeiro álbum. A obra mescla trap, R&B, soul, disco e até acústico. Toda a produção foi assinada pela própria cantora, inclusive a arte e ideia da capa, que é um trecho de curvas do eletrocardiograma da própria artista sobrepondo uma foto da rapper, na qual ela segura o próprio queixo, simbolizando reerguimento e independência. Na produção, também participaram Iuri Riobranco, Wills Bife, Nave e Santo.

A inspiração do álbum foi uma relação confusa, com alguém indisponível. Foi o fim da paixão arrebatadora, que permitiu que Matos se concentrasse no trabalho, e durante o processo profissional, conseguisse se curar. As faixas funcionam como um monólogo de uma paixão, que em uma das canções assume até um eu lírico masculino, abordando deslumbramento, dependência e proibição. Além de tematizar o durante da relação, a rapper também compôs vivendo o pós, refletindo sobre libertação, amor próprio e reerguimento, expressos, especialmente, em "Preta de Quebrada", que samplea um trecho da palestra da budista Márcia Baja sobre a importância da lucidez e do amor genuíno nas relações.
No entanto, além da alta carga emocional, o álbum também marca o início de um ciclo de autonomia artística da rapper. O tempo sem lançamentos foi um período de produção intensa, no qual a artista enfrentou problemas com gravadoras e produtores.
A rapper sentia que, no Brasil, as gravadoras impunham o artista a se encaixar nos padrões da indústria. Além disso, produtores homens tentavam, constantemente, minar a voz de Flora por sentirem que as opiniões que a cantora emitia sobre a sua música eram ordens a eles, o que feria o ego masculino. Em contrapartida, para a artista, a própria opinião era decisiva no resultado final, e por isso não deveria ser menosprezada.
Foi por causa de um desses desentendimentos, que a faixa "Igual Manteiga", produzida por Pedro Lotto, não fez parte do trabalho. "Eu tinha um álbum pronto com ele praticamente. Tinham 12 beats, seis desses tinham sido produzidos em parceria comigo, os outros cinco eram dele. Depois de alguns meses adiando de dar continuidade ao meu disco, ele me disse pra escolher apenas cinco desses 12 beats. Achei uma puta falta de respeito. Saí fora e comecei outro disco do zero", relatou Flora, em entrevista ao Noisey.
Foram essas experiências frustrantes que a deram incentivo a seguir com a música à sua maneira, já que, para ela, o que torna um trabalho autêntico e valioso diante do público, e satisfatório diante de si mesma, é traduzir o próprio olhar na criação. A cada conflito de ideias com algum produtor, Flora se esforçava para não perder a identidade como artista, e se forçava a colocar a mão na massa, produzindo sozinha alguns beats que compõe o álbum, como os de Preta de Quebrada. Essa imposição como artista é expressa em versos da faixa Sonhos Gangsta: “Com papo de investimento alto no seu rap / Mas, no fim das contas, só te atrasou, te sugou” e “Melhor coisa que eu fiz foi juntar o dinheiro pra fazer tudo do jeito que acredito / E olha onde eu tô”