Guilherme Moro
Edssada (A Outra Banda da Lua) lança álbum solo “Observatório das Micro Belezas”
Buscando o que há de mais elementar e humano em todos nós, o músico Edssada faz de seu novo EP solo um mergulho por suas raízes entre o norte de Minas e o sul da Bahia, entre o Rio Jequitinhonha e as terras desconhecidas da Índia e do mundo árabe. “Observatório das Micro Belezas” é um convite a um olhar diferente para o que parece banal, uma nova perspectiva sobre o tempo e como ele molda os níveis mais básicos da existência humana.
Edssada promove um resgate de sons e poéticas antigas e atemporais para refletir sobre seus próximos caminhos. Entre a reverência aos antepassados e um inquieto olhar para o presente e o futuro, o músico se debruça sobre questões íntimas e intimistas, porém universais.
O álbum apresenta cinco canções autorais, além de um documentário sobre o processo de construção criativa, sob produção de Caril Caril, e contando com participações de diversos artistas de Minas Gerais, do Brasil afora e América Latina: os mineiros Alexandre Zuba, Arley Nogueira, Maitê Mesquita, Maria Luiza, Edu Lemos, Matheus Bragança, Pablo Barata, Pedro Surubim, Ana Clara Oliveira, Vítor Oliva, Raphael Milo, Cyrano Almeida e Gabriela Viegas, Cínthia (de Natal/RN), Bela Parada (São Paulo/SP) e Oscar Hernan Rodríguez Triviño (Colômbia).

O trabalho de Edssada é permeado pelo congado de sua região e pelo maracatu, pelas manifestações de matrizes afro-indígenas, passando pelas cordas melódicas indianas, onde orgânico e tecnológico se encontram. Isso fica claro no single “Chá de Moringa”, uma canção onde o artista se reencontra consigo mesmo. A faixa de abertura do EP busca beleza no cotidiano, onde um convite a partilhar uma bebida, no calor da fogueira, ajuda a atravessar as tempestades da vida.
Em seguida, “Moraesiana Nº 1 (Cosmos)” surge de uma reflexão introspectiva sobre o processo de compreensão de nosso meio e como situar-se frente a ele, do ser diante do tempo que ocupa. Através de uma referência saudosa à sonoridade de Moraes Moreira, a música carrega uma homenagem também à companheira de vida, Ana Thé. Em “Samaúma”, canção que carimba a sagrada resistência de diversos povos originários do Brasil e das Américas, da árvore mãe que abastece a floresta e remedia seus conviventes, símbolo da perseverança da natureza frente ao homem.
Em seguida, ainda pulsando ritmos que atravessam nossa cultura desde tempos remotos, “O Gonguê” traça pelos autos populares uma exaltação a nossos antigos mestres, descendentes de um povo fervorosamente reprimido mas que jamais deixou de conservar em suas tradições a oralidade de histórias e conhecimentos que os mantiveram vivos e possíveis de serem sempre revividos pela evocação de cantos e tambores. Estes mestres não são capitães, nem patrões nem doutores, mas estão eternizados nas fissuras do Pau-Brasil e nos instrumentos de resistência que aqui são permeados.
Por fim, “Práxis no Campo” faz uma homenagem aos vazanteiros, aos quilombos, ribeirinhos, geraizeiros e demais povos que insistem no rufar de suas tradições e conhecimentos voltados à valorização e mantimento da natureza. Aqui, a práxis vai pela única rota possível de sobrevivência: o de elaborar novas realidades através das mãos calejadas, de conceber os novos tempos que as próximas eras pedem, resgatando conhecimentos e práticas que resistiram à avareza e ignorância ao longo do passado. A música integrará um trabalho visual com fotos da antropóloga Elisa Cotta e de João Roberto Ripper, idealizador do Imagens Humanas.
O novo EP vem para somar a uma vivência musical já plural e polivalente. Filho de Edvaldo da S. Rocha, baiano, e Maria Oliveira Lima Rocha, mineira dos vales, Edssada nasceu e foi criado em Almenara, no baixo Vale do Jequitinhonha. Na beira do rio desenvolveu e aguçou suas primeiras peripécias. Pesquisador das possibilidades timbrísticas e diversidades sonoras dos instrumentos étnicos, iniciou os estudos de violão aos 19 anos e, já em 2008, foi um dos fundadores do grupo Baru Sonoro. O projeto visava a apresentar experiências sonoras em composições e arranjos autorais, nascendo da influência de trabalhos realizados em trilhas sonoras para teatro e cinema e buscando referências da pluralidade musical brasileira e outras formas de expressões pelo mundo.
Em 2011, fundou a Orquestra Catrumana do Groove Solto, realizando a direção musical. No mesmo ano reativa o Coletivo Retomada, vinculado à Rede Fora do Eixo juntamente com outros gestores culturais. Com o Retomada, coordenou a grade da música em Montes Claros viabilizando a rota e circulação de bandas, artistas e produtores pelo Brasil. Na música, as experimentações se ramificam através dos estudos de tabla indiana e Surbahar indiano, trazendo outras possibilidades de timbres e caminhos.
Em 2015, Edssada se tornou co-fundador da primeira formação d’A Outra Banda da Lua, junto a Marina Sena e Mateus Sizílio, onde ainda atua nas guitarras, vozes e composições. O grupo lançou dois álbuns, “A Outra Banda da Lua” (2020) e “Catapoeira” (2021), e já trabalha no terceiro disco.
“Observatório das Micro Belezas” evoca um canto ao mundo, com ritmos e influências diversas, dando origem a um trabalho de sonoridade universal. As músicas foram produzidas pelo Nihil Estúdios, em Montes Claros, com os músicos e compositores Caio Bastos e André Oliva, sendo a mixagem de Leonardo Marques (Ilha do Corvo – Belo Horizonte/MG) e masterização de Anderson Guerra (Bunker Analog – Belo Horizonte).
Com “Observatório das Micro Belezas”, Edssada atesta sua versatilidade rítmica, poética e filosófica, convidando a uma jornada que não conhece fronteiras geográficas e convenções musicais, e a um mergulho onde o micro se torna macro e as belezas fugazes ganham novos e iluminados contornos.